Terça-feira, 22 de Julho de 2008

Repúblicas do Azeite

 

  João Luzío

 

  SonaeSierra | Atenas | Grécia | C11

 

É importante esclarecer as posições gregas e portuguesas no contexto europeu e mundial porque, de facto, não são óbvias. Ambos são países considerados de mediterrânicos. Países periféricos. Um na ponta sudeste e o outro no extremo sudoeste, a Europa começa e termina da mesma forma. Os últimos dos moicanos. Verdadeiras repúblicas do azeite, Portugal e Grécia, são como opostos que se tocam: o Α (alfa) e o Ω (ómega).

 

Nós temos o destino e eles a tragédia, nós temos o fado e eles a rembetika, nós temos a guitarra portuguesa e eles têm o bouzouki, nós temos a ginginha e eles o ouzo, nós o vinho do Porto e eles o vinho de Santorini, nós temos o “chico-espertismo” e eles têm o “yorgos-espertismo”, nós temos o “desenrascanço” e eles a “missão impossível grega”, eles dizem que não e nós percebemos que sim, nós demos novos Mundos ao Mundo que era grego, nós temos praias com areia excelente e eles têm praias com excelente água. Nós temos um país com planícies e poucas montanhas e eles têm um país de montanhas com poucas planícies, nós temos estradas boas e eles têm estradas más: ambos conduzimos muito mal.

 

 Nós somos maluquinhos por desporto e eles são fanáticos. Nós temos o Benfica e eles têm o Panathinaikos, nós temos o Porto e eles têm o Olympiakos, nós temos o Sporting e eles têm o AEK, nós temos o Braga e eles têm o PAOK, nós temos o Vitória de Guimarães e eles têm o Aris, nós temos o Vitória de Setúbal e eles têm o Asteras Tripoli, nós temos o GDEstoril-Praia e eles têm o Apollon, nós temos a Associação Desportiva de Oeiras e eles têm o Histon FC.

 

A Grécia teve Onassis e nós temos o Belmiro, nós temos a Amália na voz e eles têm o Aquiles no calcanhar, nós temos a Mariza e eles a Eleftheria Arvanitaki, nós temos o Quim Barreiros e eles têm o Demis Roussos, nós temos o Fernando Santos e eles têm o Φερνανδο Σαντοσ; graças a Deus (!), temos o mesmo Deus mas religiões diferentes, nós benzemo-nos para a esquerda e eles benzem-se para a direita, os nossos padres vestem-se de branco e os padres deles vestem-se de preto. Nós não reivindicamos nada, eles reivindicam tudo por nada. Nós somos hospitaleiros se gostarem de nós, as pessoas gostam deles porque são hospitaleiros. Outrora donos do mundo, Portugal e Grécia, seguiram exemplarmente uma trajectória - Descendente.

 

Exemplos de como destruir a antiga glória de um país. A verdade é que não somos descendentes de Vasco da Gama ou de Ulisses mas daqueles que ficaram, por ser mais cómodo. Tanto a Grécia como Portugal são países de comodistas; os aventureiros partiram. Somos também um país de sisudos, temos dificuldade em nos rirmos de nós próprios e esse é o primeiro passo, indispensável, para podermos melhorar. Por vezes, relaxamos naquilo que é realmente importante e somos picuinhas com pormenores irrelevantes. Já não há pachorra para os “velhos do Restelo”. Exigirá um esforço adicional de memória. Falta-nos rumo, direcção, vontade e bom-senso. Só isso. 

 

No entanto, é mais aquilo que nos une do que nos separa, mas apenas esta brevíssima comparação deve servir para identificar algumas das idiossincrasias que definem os dois países. De resto, a própria palavra idiossincrasia provem da palavra grega ιδιοσυγκασια (ίδιος, próprio + σύγκρισις, constituição, temperamento). Mesmo naquilo que somos diferentes acabamos por ser iguais.

 

Mas a minha mensagem é de esperança e nós temos um trunfo: o azeite. Poucos países se podem orgulhar de produzir sistematicamente azeite de qualidade. Azeite que é a base de uma alimentação saudável e equilibrada. Um pastel de nata ao lanche também ajuda mas a base tem de ser o azeite! Obviamente, muitas vezes, estamos com “os azeites” mas até isso é positivo. Falta-nos rumo, direcção, vontade e bom-senso. Só isso.

 

Ao longo da última década (e mais um pouco), temos vindo a produzir azeite de excelente qualidade que não tem sido aproveitado porque, infelizmente, os “azeiteiros” são retrógrados, verdadeiros “velhos do Restelo”. É uma questão de mentalidade e isso demora algum tempo a mudar. Estamos a melhorar e a colheita está a amadurecer. Não temos de ser alemães ou escandinavos. Podemos ocasionalmente comer uma salsicha, um “schnitzel” ou um “smorgasbord” mas devemos é ter a preocupação de refinar o azeite.

 

Programas como o INOV Contacto são importantes para criarmos uma nova geração de “azeiteiros”, não apenas copiar o que vemos “lá fora” mas descobrirmos o nosso próprio caminho. Ou melhor, redescobrirmos, o nosso caminho. Nesse aspecto, parece-me que os gregos estão ligeiramente mais adiantados do que nós. O meu apelo final é para que, neste processo, não se desvirtue a essência de Portugal, o azeite, que é tão português como grego.

 

publicado por visaocontacto às 08:15
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